A Francesinha de Portugal
Chef Ale Gonçalves é proprietário dos restaurantes O Fornari e da Pistache Pizza e Gastronomia. Formado em Gastronomia pela Universidade Positivo e pós graduando em Docência de Gastronomia no Ensino Superior e comanda um canal no Youtube
O leitor mais desavisado tende a imaginar que este artigo se trata da história de uma lida donzela francesa que vive em alguma cidade luz de Portugal. Mas não meus amigos, como sempre venho até vocês para falar de comida, afinal de contas é a para isso que existo neste mundão de Deus. Quero apresentar-lhes uma iguaria da nossa tão amada “terrinha”, a francesinha, que nada mais é do que um super sanduiche coberto com um molho delicioso e super secreto.
Portugal é muito mais do que bacalhau e vinhos do Porto, sua história gastronômica é tão rica quanto suas vizinhas europeias. Para começo de conversa, é o país mais antigo da Europa a ter fronteiras definidas e, ao longo da sua história, as influências de diferentes culturas como celtas, romanas e mouras foi constante. Sua dieta medieval era baseada no pão de trigo e centeio, legumes, verduras, grãos e frutas, mel, azeite e vinho, além de peixe e carne de caça para os nobres.
A partir do século XV, a culinária portuguesa ganhou mais diversidade, graças às descobertas de novos ingredientes na Era das grandes navegações. Da Ásia, vieram a cana-de-açúcar e especiarias como a pimenta-do-reino, a canela, o gengibre e o cravo-da-índia. Durante o século XVI, frades e freiras usavam as claras de ovo para preparar as hóstias para as missas e engomar seus hábitos. Como precisavam dar um destino às gemas que sobravam; acabaram virando inventando os doces a base de açúcar e gemas, uma solução pra lá de divina não é mesmo? Mas depois conto mais para vocês sobre os doces portugueses, por hora vamos nos atentar a tal da francesinha.
Conta a história que eu tal de Daniel David Silva um cidadão português que foi viver na França trouxe em sua bagagem certas influências gastronômicas e em 1950 teria inventado o prato que é muito amado pelos nossos irmãos lusitanos, a francesinha, ele teria dado este nome para sua invenção por achar que as mulheres francesas eram as mais picantes da Europa, e como seu molho levava uma boa dose de Piri-Piri, uma pimenta parecida com a nossa malagueta, não poderia ser batizado por outro nome que não o de francesinha.
Bem, como eu falava das influências francesas neste sanduíche, é fato conhecido que a principal inspiração de Daniel foi o Croque Mounsier ou o Croque Madame (este leva um ovo frito), sanduíches franceses conhecidíssimos mundo afora. Mas percebe-se que o país da cidade luz serviu apenas como inspiração mesmo, pois se na essência são ambos um sanduiche com molhos e que vão ao forno para finalizar o preparo, na prática são muito diferentes, primeiro porque para os franceses o tal sanduiche de forno deles nem é tão amado assim, já para os portugueses a iguaria é algo a ser discutido nas tascas para defender qual é o melhor.
Trata-se de um sanduiche que vai um filé de carne bovina bem fininho grelhado rapidamente, linguiças frescas, embutidas ou defumadas cortadas como uma espécie de filé e também levadas na chapa para grelhar, pode-se colocar presuntos e hoje em dia existem até as vegetarianas com molhos especiais para este público, o sanduiche é montado com três fatias de pão de forma, coberto com um ovo estalado, sobre tudo isso coloca-se fatias de queijo muçarela e vai tudo para o forno ou uma salamandra para derreter este queijo, depois adiciona-se o fator essencial para transformar este sanduiche em uma iguaria inesquecível, o molho francesinha.
Cada bar, tasca ou taberna tem a sua receita especial e exclusiva, mas basicamente é um molho que leva tomates, um bom mirepoix, fundos de carnes, fundos de camarão e fundos de legumes, fica horas sendo preparado para que todo estes sabores se concentrem e transformem-se em algo único. Este molho depois de pronto então é aquecido e servido sobre o sanduiche já gratinado, assim fica tudo nadando neste néctar dos deuses e picante como as francesinhas da cabeça de Daniel.
Não é algo fácil de se reproduzir em casa, por isso querido gafanhoto, quando for a Portugal, não deixe de visitar a cidade do Porto e procurar por uma boa tasca ou taberna e experimentar esta iguaria. E quem sabe em outra oportunidade eu lhe traga uma receita para você preparar e surpreender seus convidados. Até logo e viva Portugal!!