Inteligência emocional e relação empática podem evitar conflitos no condomínio
Recentemente, observei o que seria o início de um conflito em um condomínio curitibano classe média, com mais de 200 unidades, que me fez refletir sobre o quanto nosso julgamento pode estar contaminado pela forma obtusa de ver o mundo, e por generalizações que fomentam discussões que poderiam ser evitadas pela relação empática. A história aconteceu mais ou menos assim:
No grupo de WhatsApp, um morador alertou que as crianças estavam mexendo nas pedras da jardinagem, deixando-as no entorno e dentro da fonte de água do espaço de convívio/lazer. Além disso, alguns brinquedos da brinquedoteca estavam sendo utilizados fora do espaço. Essas crianças seriam convidadas de um evento que acontecia no salão de festas do condomínio.
Isso foi o suficiente para que as pedras começassem dentro do grupo de WhatsApp. Alguns moradores reclamando que isso sempre acontece, que o anfitrião da festa deveria ser punido, que não seria permitido o uso do espaço, uma vez que a locação abrangia apenas ao salão de festas, e não a área de convívio. Emojis de raiva, carinhas assustadas e indignadas tomaram conta da tela do celular.
À noite, a pessoa que utilizou o salão de festas leu todas aquelas mensagens e certamente se sentiu mais apedrejada que a fonte de água. Então, com muita educação, explicou: “A festa de hoje foi do meu filho, que é autista. Pela primeira vez pudemos comemorar o aniversário dele entre amigos da terapia, que também são autistas (…)”. E então continuou o relato mencionando que as pedras haviam sido recolhidas, os brinquedos da brinquedoteca igualmente e que, se houvesse algum tipo de prejuízo/dano, ela estaria à disposição e certamente se responsabilizaria pela questão.
Imediatamente o grupo foi bombardeado de mensagens de solidariedade e compreensão, corações, carinhas tristes e muita vergonha. Por quê? O que geralmente pode ser considerado uma atitude rude ou egoísta, quando recebe uma explicação plausível para o comportamento, tende a gerar empatia, de modo que as pessoas vejam além das ações superficiais e considerem o contexto mais amplo, gerando uma certa flexibilidade e tolerância.
Não estou aqui defendendo um conceito de que as regras possam ser descumpridas deliberadamente, pois todos teriam seus motivos para fundamentar as infrações. Nada disso. O condomínio viraria uma anarquia e o direito de uso coletivo e propriedade seria altamente prejudicado se cada um fizesse o que bem entendesse.
O ponto é que no condomínio, no trânsito, no trabalho e em relações interpessoais em geral, a abertura para tentar entender o contexto e considerar que diversas variáveis podem influenciar as ações cotidianas das pessoas contribui para que o julgamento e o conflito deem lugar à compreensão e, consequentemente, proporcione pensar em alternativas de contornar os desafios e a ter tolerância.
Viver em condomínio é desafiador. Viver em sociedade, igualmente. Sei que a interpretação do que seria uma “explicação plausível” para cada ato é muito subjetiva e depende no nível de tolerância de cada um. A questão é que estamos cada vez mais intransigentes e imediatistas, e isso não leva a lugar algum. Exercitar a inteligência emocional é fundamental para o próprio bem-estar. E que atire a primeira pedra quem nunca errou.
Por Karla Pluchiennik, empresária, consultora da rede Condomínios Garantidos e autora das obras “Quórum no Condomínio” e “Coisas Básicas do Condomínio”