Maioria das crianças não sabe distinguir armas reais das de brinquedo
Estudo destaca a necessidade de campanhas para educar os pais sobre a importância do armazenamento seguro de armas de fogo
Um novo estudo descobriu que a maioria dos pais e cuidadores, incluindo os proprietários de armas de fogo, disse que estava confiante de que seus filhos poderiam distinguir entre uma arma real e uma arma de brinquedo. As próprias crianças também disseram que achavam que podiam reconhecer a diferença. Mas quando foram exibidas fotos, lado a lado, de armas de fogo reais e falsas (brinquedo), apenas 41% das crianças e adolescentes, entre 7 e 17 anos de idade, identificaram os dois tipos corretamente.
Um resumo do estudo, “Uma comparação dos padrões de armazenamento de armas de fogo e do acesso das crianças às armas de fogo”, foi apresentado durante a Conferência Nacional da Academia Americana de Pediatria-2018 (AAP).
Segundo os autores, uma das descobertas mais impactantes foi a facilidade com que os cuidadores e as crianças podem confundir armas reais com armas de brinquedo (muito realistas hoje em dia). Entre os resultados da pesquisa, também foi relevante que os proprietários de armas pesquisados tinham quase o dobro de chances, quando comparados com os não proprietários de armas, de permitirem que seus filhos brincassem com armas de brinquedo. Ainda de acordo com os pesquisadores, o armazenamento seguro das armas de fogo nas casas onde as crianças brincam com armas é crítico.
Para o estudo, Fraser Doh e seus colegas entrevistaram 297 pais e crianças que frequentavam um dos três departamentos de emergência pediátrica – dois suburbanos e um urbano – no sudeste dos Estados Unidos, em um período de três meses, em 2017. Os pais que tinham armas representam 25% dos entrevistados e tinham uma probabilidade significativamente maior de serem brancos, ter uma renda anual de mais de US $ 50.000 e alguma educação universitária, em comparação com os não proprietários de armas. Os donos de armas também eram mais propensos a permitir que seus filhos brincassem com armas de brinquedo (51%, em comparação com 26% dos não proprietários de armas).
Além de perguntar sobre armas de brinquedo, os pesquisadores perguntaram a todos os pais sobre a facilidade com que achavam que seu filho poderia ter acesso a uma arma de verdade. Poucos cuidadores (5%, no total) afirmaram que seu filho poderia obter uma arma em 24 horas. No entanto, os resultados mostram que 14% das crianças, cujos pais possuíam armas, e 4% das crianças, cujos pais não possuíam uma arma, disseram que poderiam acessar uma arma dentro de um dia.
Entre os proprietários de armas de fogo do estudo, a maioria recrutada nos hospitais suburbanos, menos da metade (34%) armazena sua arma em local fechado, descarregada e separada da munição, conforme o recomendado pela Academia Americana de Pediatria (AAP). Além disso, entre as crianças que relataram ter uma arma em casa, 53% sabiam onde ela estava guardada e 45% sabiam onde a munição estava armazenada.
Armas em casa x segurança das crianças
Após a publicação do Decreto 9.685/2019, que dispõe sobre registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição, a preocupação com a posse de armas e a segurança das crianças é uma pauta atual.
Na avaliação do pediatra e homeopata Moises Chencinski “a questão não está na discussão sobre a ideologia ou da liberdade da posse ou não de arma pelos adultos, mas nos riscos potenciais impostos às crianças e adolescentes, conforme mostram os estudos”.
A ONG Criança Segura, que faz parte da rede internacional Safe Kids Worldwide, ressalta que a criança é curiosa e exploradora, procurando por qualquer objeto escondido, mesmo os perigosos. “Por isso, temos a orientação sobre cuidados com a guarda de medicamentos, produtos de limpeza, objetos cortantes (facas, tesouras). E as armas de fogo também se enquadram nesse grupo de risco”, alerta o médico.
Outros estudos demonstraram que crianças de até 8 anos não conseguem distinguir uma arma real de uma de brinquedo e a partir dos 3 anos de idade, a criança já tem força suficiente para apertar o gatilho de uma pistola.
“Sabemos que desenhos e filmes infantis abordam temas de violência e em artigo publicado em nosso site, os ‘mocinhos’ demonstraram maior violência do que os ‘bandidos’. E nessa pesquisa, os dados são claros e preocupantes: O ato mais comum de violência associado aos protagonistas dos filmes foi o combate (1.021 atos totais), seguido do uso de uma arma letal (659), destruição de propriedade (199), assassinato (168) e intimidação/tortura (144). Para os antagonistas, o ato violento mais comum foi o uso de uma arma letal (604 atos totais), combates (599), intimidação/tortura (237), destruição de propriedade (191) e assassinato (93) também foram retratados”, informa o médico.
“Assim, ao mesmo tempo em que se discute a ideologia e a legislação sobre a liberação da posse de armas, tão ou mais importante é o debate que deve determinar os cuidados, o acesso e a segurança da presença de armas de fogo em casas com crianças e adolescentes. Esse deve ser o foco dessa discussão”, defende o pediatra Moises Chencinski.