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Cláusula vira armadilha

Por Luiz Fernando de Queiroz, autor do TPD-Direito Imobiliário e do Guia do Condomínio IOB

Problema de difícil resposta nos foi formulado.

Resumimos:
“Primeiro é importante ressaltar que o índice de inadimplência do condomínio chega a um patamar de 48%, que vem se mantendo já há alguns anos. Alguns dos inadimplentes não pagam por problemas de ordem pessoal com ex-síndicos, outros porque também estão deixando de pagar as prestações junto ao agente financeiro. Para se ter uma ideia da gravidade, nos meses de junho a agosto tivemos que estabelecer horários para uso do gás, vez que o condomínio não tinha dinheiro para pagar o reabastecimento.”

Prossegue:
“Em agosto, decidimos por alterar a convenção do condomínio, o que foi feito através de assembleia específica. Na convenção há cláusula estabelecendo que os inadimplentes não têm direito a voto. Cumprindo todos os trâmites, conseguimos aprovação daqueles adimplentes com direito a voto (o que deu mais que os 2/3 exigidos pela lei e pela convenção). No entanto, a alteração não passou no registro de imóveis ao argumento de que as assinaturas não representavam, no mínimo, 2/3 das frações ideais que compõem o condomínio.”

Continua:
“Realmente, concordamos que a aprovação não se deu com os 2/3 de todos os condôminos. Mas nem teria como ser diferente. Afinal, se condômino inadimplente não vota, não conseguiríamos nunca atingir tal fração. Assim, a interpretação que temos, e a que pretendo levar à Vara de Registros Públicos é que em havendo uma cláusula que não permita a votação dos inadimplentes, não há como considerá-los na assembleia, sob pena de nunca se conseguir alterar a atual convenção.”

Hoje, o próprio Código Civil estabelece que apenas os condôminos em dia com o pagamento das cotas podem participar de assembleia: “Art. 1.335. São direitos do condômino: (…) III – votar nas deliberações da assembleia e delas participar, estando quite” (grifo nosso).
Lembra o Telecondo, em miniparecer sobre esta mesma pergunta, que a Lei 4.591/64, ao tratar da aprovação da convenção (art. 9º), diz que esta se considera aprovada quando “reúna as assinaturas de titulares de direitos que representem, no mínimo, 2/3 das frações ideais que compõem o condomínio”, entendendo, pois, que se a convenção e o próprio Código Civil instituem restrições a determinados proprietários, estes não seriam tidos como “titulares de direitos”. Assim, a limitação do direito de voto dos inadimplentes não pode servir como argumento para se negar o registro da cártula condominial.

O novo Código Civil ainda determinou, em pelo menos dois artigos tratando das penalidades impostas aos condôminos (1.336 e 1.337), o quórum com base nos “condôminos restantes”, excluindo os infratores do cálculo. Aplicando-se, por analogia, este princípio, temos mais um argumento a sustentar que os inadimplentes não devem ser incluídos na conta de deliberação do condomínio, o que permitiria o registro de alterações da convenção pelo quórum ‘líquido’ de 2/3 dos condôminos.

Em outras palavras: não pode mais a Vara de Registros Públicos recusar-se a registrar mudança em convenção de condomínio aprovada por no mínimo 2/3 dos condôminos em dia com as suas obrigações.

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