Catadores enfrentam queda na geração de emprego e de renda
A pandemia do coronavírus trouxe uma mudança no comportamento de muitos brasileiros
Por estarem mais tempo em casa, a quantidade de resíduos sólidos domésticos aumentou e, com isso, também cresceu a demanda pelos serviços de coleta seletiva. Por ser considerada um serviço essencial, o trabalho não foi suspenso. Mas, por outro lado, a pandemia gerou novos problemas sociais tanto em relação à geração de emprego e de renda quanto em relação à saúde dos catadores de materiais recicláveis de todo o Brasil.
Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os catadores são responsáveis por 90% de todo o lixo coletado no país. Mas com a menor circulação de pessoas e o fechamento de estabelecimentos, caiu a quantidade de material coletado e muitos deles ficaram sem qualquer tipo de renda. Mais de um milhão de catadores do Brasil tiveram uma redução de 80% em sua renda de um salário mínimo, em média, segundo o Movimento Nacional dos Catadores de Recicláveis (MNCR).
“O que é triado nas associações de catadores e tem valor econômico é vendido aos recicladores, mas com a paralisação das atividades das cooperativas, eles foram muito atingidos. Houve uma queda no preço e na disponibilidade dos materiais vendidos e o aumento do lixo doméstico não supriu essa demanda. Essa é uma população que precisou da assistência social das Prefeituras”, explica Gustavo Fanaya, consultor do Instituto Paranaense de Reciclagem (InPAR).
As cooperativas e associações de reciclagem que adquirem boa parte do material vindo dos catadores também sofreram um forte baque durante a pandemia. Até o mês de junho, 23% das cooperativas ainda não tinham voltado a funcionar e 87% tiveram uma queda significativa na retirada em termos de preços e quantidade de materiais. As informações são da Plataforma Reciclar pelo Brasil, programa colaborativo de iniciativas de reciclagem que atende 160 cooperativas em 21 estados do Brasil.
O secretário-executivo da associação, Edy Merendino, explica que, para a volta das cooperativas, se fizeram necessárias várias adaptações e mudanças na maneira de trabalhar. Mas, segundo ele, as dificuldades financeiras ainda são grandes. “Teremos que adotar novas práticas, como uma limpeza mais continua dos equipamentos, preocupação com os EPIs e a implantação de ciclos menores de trabalho. Também instituímos um manual de boas práticas e diminuímos a quantidade de visitas. Com as mudanças na maneira como trabalhamos precisamos implantar novas práticas e fica difícil que as cooperativas arquem com esses custos”, ressalta.
O consultor do InPAR explica ainda que é grande a preocupação com a saúde por parte dos catadores, especialmente por conta de materiais que podem estar contaminados com o coronavírus. “O ideal seria que os catadores tivessem à disposição materiais de proteção como EPIs e que os resíduos ficassem de quarentena, além de serem orientados pelo poder público. Mas são trabalhadores em situações precárias. Como a manipulação dos resíduos residenciais pode ser até mesmo mais penosa por conta da falta de separação, eles estão sujeitos a mais riscos”, destaca Fanaya.
Tanto Merendino quanto Fanaya explicam que é necessário que haja investimentos tanto em coleta seletiva, como em estrutura e segurança para os catadores e para as cooperativas de reciclagem. Segundo Fanaya, o investimento na gestão dos resíduos sólidos traz diversos benefícios ambientais e também sociais, uma vez que é um grande gerador de emprego, renda e oportunidades para famílias em todo o país.
“Fazem parte das obrigações previstas na Política Nacional de Resíduos Sólidos os investimentos por parte do setor empresarial, mas sem esquecermos que as prefeituras e órgãos ambientais também têm que prever um plano de gerenciamento de resíduos, que incluam essas cooperativas. Queremos que todos esses entes enxerguem os benefícios desses investimentos e atuem de modo coordenado”, explica Edy Merendino.
O trabalho em conjunto entre consumidores, órgãos públicos, indústrias e cooperativas faz parte do princípio da responsabilidade compartilhada proposta pela Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), que completou dez anos em agosto. A logística reversa é um dos instrumentos previstos na PNRS que é baseado em um conjunto de iniciativas que visam viabilizar a restituição dos resíduos pós-consumo ao setor empresarial, ou seja, fazer com que os produtos descartados possam retornar à cadeia produtiva. A reciclagem é uma das alternativas previstas para o cumprimento da logística reversa.
As indústrias associadas realizam investimentos para cumprirem as metas e estarem de acordo com a PNRS. O InPAR repassa o montante para projetos apoiados pelo programa Reciclar pelo Brasil, que inclui o apoio e o investimento para associações e cooperativas de reciclagem pelo Paraná.